terça-feira, 27 de outubro de 2015

3 filmes da Mostra Internacional de Cinema de SP

Valentina Herszage, em Mate-me por favor


Como o escritor deste blog está acompanhando a 39ª Mostra Internacional de Cinema, ele aproveita a chance de ver alguns filmes e comenta três que teve a oportunidade de assistir, cada um em um parágrafo:

Um cinema econômico, direto, mas nada óbvio. A profundidade das personagens aparece a partir de cenas que inteligentemente mostram, ao invés de só dizer. As aves e outros animais se relacionam com a personagem que dá título ao filme menos com metáforas do que como outros personagens também tentando sobreviver. A história: Wanja tenta se encaixar nas exigências da sociedade depois de passar sete anos na cadeia. A relação inexistente com uma filha distante ganha uma segunda e bizarra chance em sua relação com a jovem Emma. A vida juvenil de tédio e perigo no interior do norte da Alemanha, as dificuldades de ressocialização de uma mulher mais velha neste ambiente, a tentação das drogas, estes temas são tratados em imagens limpas, sem desespero, mas com uma sobriedade (de certa forma, irônica) quase insuportável.

A adolescência, fim da infância, início da vida adulta, começo do fim, é retratada nas imagens cuidadosamente pintadas deste filme em suas contradições e intensidade desnorteantes. Neste thriller juvenil, a mente da jovem protagonista Bia é aos poucos tomada por impulsos externos, uma misteriosa série de assassinatos com motivação sexual, e internos, a descoberta dos prazeres do corpo, das relações íntimas que os medeiam e de sua própria mortalidade. O sexo e a morte seduzem misturados o conjunto de jovens garotas em seus diversos cenários: escola, festa, igreja evangélica. O corpo aparece como extensão a ser descoberta, testada, mapeada, explorada até seus limites. O adulto é como se não existisse, absorvidas que estão as personagens em suas vidas. O funk melody é o tema musical que funciona com plano de fundo e modelo de abordagem: com a coragem e o risco de tratar de temas limites como a sexualidade e a pulsão de morte de jovens garotas.

Maria Augusta Ramos é uma das diretoras de documentário mais talentosas do Brasil. Em seu último documentário, sobre o processo de ocupação militar do Morro dos Prazeres no Rio, seu estilo alcançou o ápice da beleza e do rigor. Seus documentários são construídos do ponto de vista narrativo e representativo como se fossem filmes de ficção. As pessoas-personagens interagem entre si como se não estivessem sendo filmadas, com a naturalidade de atores profissionais. Em Futuro Junho percebemos que o evento-turbilhão Junho de 2013 ainda não foi completamente compreendido ou assimilado por nós como sociedade. Estamos ainda em Junho e o processo de luta contra a Copa do Mundo da FIFA, no qual Maria foca este documentário, é sua continuação-manutenção. As cenas escolhidas para retratar o cotidiano da vida dos quatro personagens (e as linhas invisíveis que o filme traça entre elas) são tão apuradas e falam tanto sobre ela que parecem fruto de roteiro de ficção. Assim como em Morro dos Prazeres, Maria se recusa a tomar acriticamente um lado. Seu trabalho é baseado na pluralidade dos discursos e no efeito reflexivo causado por sua justaposição. A beleza e veracidade de algumas imagens do filme arrepiará quem participou da luta, seja como protagonista, observador ou impactado.

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